domingo, setembro 23, 2007

A essência da tristeza

Começo este texto pela conclusão, numa toada de método tópico: a tristeza é uma forma de incumprimento da obrigação, ergo, uma violação do direito de crédito.
Por partes: acima de tudo, há que perceber que a dita cuja não é mais que um sentimento, sendo que, nessa condição, se torna muito difícil de a definir. Tente-se, contudo. Primeiro, assimile-se que esta provém da violação de alguma vontade, ou crença, que tenhamos. Pode, ou não (a violação) ser expectável, mas normalmente não é. Certo académico diria que é uma violação da tutela da confiança, pelo que haveria lugar a reparações. Concordo.
A tristeza é, ao fim e ao cabo, um produto de uma violação de qualquer coisa, da privação de algo que nos fazia felizes.
Tendo isto em linha de conta, só há violação se existir uma relação. Não uma relação no sentido amoroso, ou mesmo familiar, uma relação entendida strictu sensu, como seja uma ligação, da mais ínfima que tenhamos ideia, entre duas almas. Espera-se de uma e de outra parte que hajam de acordo com as boas normas sociais, ou, citando o mesmo académico, sigam os ditames da boa fé. Normalmente, acontece, a regra é acontecer, como tal, entre as pessoas gera-se um nexo de reciprocidade que as faz exigir, de si e do próximo, um comportamento que não as fira, que não as magoe. Elas têm esse direito à conduta do próximo. É quase um direito, naquele sentido subjectivo.
Se entendermos o Direito de Crédito como permissão normativa específica de aproveitamento de uma prestação e tomarmos prestação como uma conduta exigível ao devedor, então, analogicamente, podemos transpor estas realidades jurídicas para a vida vivida e, finalmente, perceber: a conduta não existiu, violou-se aquele direito de crédito, temos que ser compensados, tudo ao momento daquela "quebra" entre duas pessoas ligadas, ainda que pelos laços mais estreitos.
Mas a vida não é direito. Pelo menos não é só direito.
Porque ninguém me vai indemnizar por estar assim. Pelo menos pelos motivos, pela violação que culminou neste estado.
Essa é a essência: aconteceu e há que lidar com isso da melhor forma possível, porque não virá ninguém acorrer. Ainda que haja solidariedade, ainda que haja alguém na mesma situação, ninguém pode reparar um estado de espírito.
Porque não é possível.