Aproximando-se dezembro, inevitável se torna a deslocação às lojas, a fim de acautelar a realização da troca de prendas.
A irmã tinha ido, para tal efeito, ali perto e convidou-o para almoçar. Aceitou.
Ela deu-lhe boleia, ele escolheu o sítio. Tripla vantagem: boleia, escolha e almocinho no bucho.
O tal almoço foi como todos os outros: brincadeira, conversa, estado da vida.
Chegado a casa, à noite, como é costume, fez o filme do dia. À entrada para o restaurante, tinha-lhe dito: "nem sei bem porquê, mas este ano sinto pouco espírito natalício".
Ela também. Foi o que lhe respondeu.
O "porquê" seguia-se.
Uma mesa que chegou a ter 12 pessoas passou e menos de metade. A vida encarregou-se de fazer o que faz.
No topo, sentava-se um fenómeno. Um fenómeno que só sabia brincar, mandar a piada certa no momento certo. Ao lado dele, podia dizer-se que a fome se aliava à vontade de comer. Se um dizia "mata", o outro dizia "esfola". Estava ali a festa toda.
Noutras pontas, verdadeiras forças da natureza. Terminado o jantar, punham-se a lavar tachos e toda a loiça, isto depois de um dia de trabalho.
Fluía a conversa, em vez de doenças, falava-se da vida. Em vez dos mortos, celebrava-se a existência.
Nunca se havia lembrado de ter sido tão cliché, mas os clichés são clichés por alguma razão. Como os fenómenos de massas, aqueles que fazem o Despacito ser tantas vezes ouvido.
Agarra-se aos que restam. Merecem que não se chore, somente, pelos que partiram e esqueça os que cá estão.
É que percebeu as caras fechadas nesta quadra. Quem dela não gosta. Quem dela se quer esquecer.
Não que se queira trilhar esse caminho. Mas é que a consciencialização tem destas coisas.
Lidar.
É lidar.